Colorifix é uma empresa que desenvolveu uma fórmula de tingimento através de micoorganismos derivados com a sequenciação de ADN. A firma, com escritórios no Reino Unido e em Portugal, afirma que esta é uma solução amiga do ambiente para corar tecidos.
“O que nós fazemos é encontrar cores que existem na natureza e, em vez de extrair a cor em si – o corante -, nós extraímos a informação de como é feito, através do ADN”, explica à Renascença o CEO da Colorifix, Orr Yarkoni.
“Com esse ADN, modificamos microrganismos que vão consumir açúcar e miolo de soja para criar todas as cores através do açúcar e nitrogénio. Tal como é feito na natureza”, acrescenta.
O ADN é proveniente de plantas e animais, como insetos. “Já fizemos uma melatonina de gorila, por exemplo”, partilha Orr Yarkoni.
Quando questionado sobre como se obtém este ADN, o responsável da Colorifix explica que não extrai diretamente da natureza. “Em vez disso, entramos em bancos de dados de DNA e apenas copiamos a mensagem que produz o pigmento que desejamos”, esclarece.
“Nunca tivemos acesso a tanta informação sobre DNA como temos hoje, o que significa que não precisamos de tocar em nada na natureza para obter a sequência que precisamos”, assegura.
Porque importa para o meio ambiente
A Colorifix é o resultado de uma viagem ao Nepal. Orr Yarkoni e Jim Ajioka, co-fundador da empresa, viajaram por este país asiático em 2013. Foi lá que descobriraram os efeitos do processo de tingimento na água.
“Estávamos a trabalhar num projeto de qualidade de água, a medir a quantidade de metal que estava na água potável”, conta Orr Yarkoni à Renascença. “Enquanto estávamos a fazer esse trabalho, perguntamos às pessoas, tanto no Governo como nas aldeias, que outros químicos na água queriam que pudessemos medir. Deram-nos uma longa lista de químicos e fizemos o nosso trabalho”, explica.
Foi assim que Orr e Jim depararam-se com a origem desses químicos. “Surpreendentemente, muitos deles vieram da do têxtil da moda e uma grande parte do processo de tingimento”, nota.
O impacto da moda no ambiente, nomeadamente na água, tem sido alertado por várias instituições.
Entre 8-10% das emissões de carbono, é quanto cria a indústria da moda, segundo a Organização das Nações Unidas (ONU). Por outras palavras, é responsável por mais emissões do que todos os voos internacionais e transportes marítimos juntos.
93 mil milhões de metros cúbicos. É a quantidade de água que o setor usa, o que, de acordo com a ONU, daria para satisfazer as necessidades de cinco milhões de pessoas – metade da população portuguesa.
5 triliões de litros de água é usada, todos os anos, para tingir tecidos. Valor que equivale a 2 milhões de piscinas olímpicas.
Estes são números que Orr Yarkoni e Jim Ajioka pretendem reduzir com a Colorifix. “Desenvolvemos a tecnologia, começamos a falar com marcas e com as tinturarias para ver se realmente havia uma oportunidade para mudança e a indústria foi muito acolhedora”, diz o dono da Colorifix.
“Queremos mudar o esquema de utilização desta indústria. É o nosso propósito: a segurança do ambiente e, especialmente, da água. É uma coisa que temos de tratar hoje para existir amanhã”, sublinha.
É uma solução (realmente) sustentável?
A inovação da Colorifix está em usar ADN para corar tecidos. Apesar da transformação de componentes naturais em microorganismos já ser feito de várias formas, o gerente da empresa afirma que, até à Colorifix, ainda não era usada para dar cor aos têxteis. “Nós não só usamos os microrganismos para criar o pigmento ou o corante, mas para o aplicar ao têxtil, poupando energia, água e emissões”, garante.
Mas será esta a chave para a sustentabilidade da indústria?
Salomé Areias é investigadora em sustentabilidade e conscientização do consumidor no centro de investigação CERSER (Center for Environmental and Sustainability Research). É também membro da Fashion Revolution, uma organização sem fins lucrativos internacional que defende uma indústria da moda “limpa, justa, transparente e responsável”. A sustentabilidade ambiental é, por isso, um dos temas que a instituição se debruça.
Para Salomé Areias, a resposta é clara como água: esta não é uma medida sustentável.
“É impossível definir uma inovação, um comportamento, uma marca isoladamente como ‘sustentável’ debaixo de um sistema capitalista e centrado no crescimento económico”, defende a investigadora em declarações à Renascença.
Salomé Areias esclarece que a questão a sustentabilidade “não tem muito a ver com a tecnologia em si, que é válida,” mas sim na quantidade de peças de roupa que é produzida, “que está ativamente entre os 100 mil milhões e os 150 mil milhões ao ano, produzida mundialmente”.
A investigadora defende que, para a indústria da moda ser realmente sustentável, não se deve olhar apenas para a tecnologia, mas sim lutar por uma redução na produção.
Aliada a esta necessidade na redução, Salomé Areias sublinha que um dos parceiros da Colorifix é a H&M, a empresa de moda sueca que, segundo a investigadora, produz cerca de 3000 milhões de peças de roupa por ano. “Parece-nos injusto olhar para uma medida específica, dizer que ele é sustentável quando, na realidade, isso é uma maneira de lavar as mãos e de limpar a com de uma conduta específica, quando na verdade, o próprio sistema, do ponto de vista global, é insustentável.”
“Tudo o que nós fizemos debaixo do sistema capitalista e na indústria têxtil, como ela está construída maioritariamente virada para o fast fashion, vai sempre ser insustentável, enquanto não mudarmos o próprio sistema.”, defende Salomé Areias.
Quando questionada se o sistema capitalista não leva a um espaço que permite a inovação e soluções que podem, porventura, ser benéficas para a sociedade, Salomé volta a negar.
“Nós vivemos sem capitalismo durante centenas de milhões de anos. A inovação está inerente à nossa espécie. Nós continuamos a criar coisas maravilhosas, não é por causa do capitalismo. Nem foi o capitalismo que potenciou ainda mais a ciência e a inovação. A história mostra isso.”
Inovação é algo que Salomé Areias declara não estar a chegar ao mundo da moda. “A nível de design, [a indústria da moda] é a que inova menos. Nós temos o mesmo tipo de vestuário há centenas de anos. Para o nível de integração no que é o sistema de produção, é sempre a mesma coisa. Nós queremos sempre, calças, saias, camisa…”
A investigadora acrescenta que a procura pela sistematização e o baixo custo são factores que não deixam espaço para a inovação.
Esta especialista apontou ainda que, um dos receios em inovações como estas, é que levem as pessoas a comprar mais, quando, defende, o que seria realmente sustentável é as pessoas comprarem menos.
Mas o que tem Orr Yarkoni, que quis criar uma empresa sustentável e para um mundo melhor, tem a dizer sobre isto?
“Seria sempre melhor se as pessoas utilizassem o que têm ao máximo possível e consumissem o mínimo possível para o planeta. Sempre será a melhor solução. Mas para a sociedade, perante as necessidades da pessoa do dia-a-dia, vai sempre ser necessário usar roupa.”
Perante esta necessidade, Orr Yarkoni afirma que a prioridade para a Colorifix é poder dar-lhe uma resposta mais sustentável. “Em vez de comprar uma t-shirt feita de uma forma, pode comprar uma t-shirt feita de uma forma melhor.”
É nessa forma que fazer melhor que a Colorifix pretende trazer “cor à sua vida”, como é possível ler quando abrimos o seu website.
Orr Yarkoni afirma que a inovação da sua empresa não fica por aqui. Juntamente com os seus parceiros, pretendem continuar a investigar formas de melhorar o processo de corar têxteis, de forma a torná-lo mais ecológico. Além da H&M, exemplos dos seus parceiros são a Universidade de Cambridge, a Acatel, e também a RDD Textiles.